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sábado, 3 de março de 2012

QUASE NO FIM

O carnaval valia uma festa de graça, de bom humor e de contagiante alegria. Em tempos mais remotos, quando a folia se iniciava, depois que proibiu a estúpida brincadeira do entrudo, ainda no século passado, o carnaval se fazia nos bailes dos clubes sociais e nas ruas - e nessa época mais antiga a máscara era a principal fantasia no reino do Momo. E a evolução para melhor se processou ano por ano. Apareceram os ranchos, os cordões, os blocos, cheios de entusiasmo, que percorreriam as ruas e prestigiavam as danças nos salões. Uma beleza, momentos de efusivas manifestações de pândega. Que dizer das saudosas batalhas de confete e lança perfume nas praças animadas de inesquecíveis sambas e marchas executadas pelas bandas militares? O automóvel e o caminhão fizeram o corso gostoso. Percorriam-se ruas previamente escolhidas e veículos, marcha vagarosa, lotados de moças e rapazes, se enfeitavam e de um para outro jogava-se colorida serpentina. Muita cantiga bonita e movimento de corpo. Pelas vias públicas desfilavam homens fantasiados. Muito bom humor em tudo. Raras as brigas se verificavam. Nos grandes centros registrava-se às vezes um crime de morte. Governos federais, estaduais e municipais nada gastavam nessa ruidosa brincadeira nacional.

A festa de Momo transformou-se numa desasseada manifestação de complexos, explosão de baixos sentimentos recalcados. O que parece alegria, representa fúria, violência. Uma válvula de escape para os protestos de angústia e para que os doentes espirituais fujam da sua realidade.

O carnaval tornou-se monótono. Vive dos órgãos oficiais que ajudam a indústria da festa. Os clubes conseguem não pagar impostos. Ao cabo de contas, as escolas de samba. Todos os anos a mesma cousa. Remelexo, bumbuns de fora, o boi da cara preta também, seios amostrados. Homossexuais, hetero, giletes e outros tipos da selva pornográfica desfilam à custa de verbas do erário, para que os que moram em casebres de taipe, em favelas, ou debaixo das pontes, em quartos de papelão, felizes, pensem que participam da festa do povo.


A. Tito Filho, 07/03/1992, Jornal O Dia

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