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quinta-feira, 8 de março de 2012

CRIMINOLOGIA DAS MULTIDÕES

Elias de Oliveira e Silva nasceu na terra piauiense de Piripiri. Cultivou o soneto, quando moço - o soneto terno, voltado para a mulher nos seus atrativos físicos. Conheci-o em Fortaleza - elegante, cabeleira basta, olhos amortecidos de carcamano, inteligência ágil. Vi-o mais de uma vez na tribuna do júri. Argumentador seguro e culto. Palavra fácil, por vezes irônica. Grande estudioso de ciência penal. Escreveu valiosas obras jurídicas, discutindo impostos, intervenção federal nos Estados, crimes de incêndio e outras matérias. O livro que o colocou entre os mais conceituados no assunto chamou-se "Criminologia das Multidões", estudo de psicologia coletiva aplicada ao direito criminal. Problema curioso e complexo o da multidão criminosa. Franceses e italianos lançaram os fundamentos de um estudo longo e difícil, mas lacunoso. O mais integro que conheço é o de Scipio Sighele, nomeado "A Multidão Criminosa".

No campo da arte, ninguém ofereceu pintura magnífica do crime coletivo como Zola, em "Germinal". É verdade que outros escritores célebres procuraram revelar a psicologia das multidões, como d'Annunzio, Sienkiewicz, Hugo, Manzoni - mas Zola mostrou-se real com os seus neuróticos, os seus anormais, os inoculadores do veneno da loucura no corpo coletivo.

No meu entendimento, Sighele tem falhas que foram supridas por Elias. Certíssimo o conceito de multidão no jurista piauiense: multidão não é o povo que circula, as massas que compõem a Nação, o público que enche as artérias de uma cidade. Há de compreender-se a multidão, inicialmente, no seu sentido psicológico. Não há multidão sem organização, embora provisoriamente, casual, provisória. Sustenta Elias que a multidão é o agrupamento provisório e heterogêneo de pessoas, instantaneamente organizado, com um objetivo qualquer e cujos caracteres reproduzem, exagerados pela sugestão, finalidades comuns inferiores da maioria dos componentes, preponderando especialmente as tendências instintivas e bestiais reclamadas ao inconsciente.

Esse recalque constitui o grande responsável pelo crime da multidão. Elias fez o que raros fizeram: buscou um gênio para a explicação da violência das multidões - Freud. Ainda não houve quem derrotasse Freud. Certa vez observei que os recalques freudianos estão até nas manifestações dos campos de futebol, como nas arenas das touradas espanholas.

Grande jurista esse hoje esquecido Elias Oliveira e Silva. Talvez não o conheçam os universitários piauienses dos cursos jurídicos ministrados piauienses dos cursos jurídicos ministrados pela Universidade Federal do Piauí. O Piauí será sempre assim: despreza os talentosos homens de inteligência que aqui nasceram. Só os de fora prestam. Santo de casa não faz milagre.


A. Tito Filho, 14/01/1992, Jornal O Dia

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