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segunda-feira, 2 de abril de 2012

DONDON

No cartório do registro civil de Livramento, hoje José de Freitas, deve constar o nome de Antônio Castelo Branco, que o Piauí todo conhece pela alcunha de Dondon, fundador em Teresina de jornal famoso, a que deu o nome de "O Denunciante" e em cuja edição de número 12, de 18 de maio de 1927, lemos, na última página, os dez mandamentos que o jornalista escreveu para que fosse possível o seu segundo casamento com a mesma mulher. Ei-los, mudando-se a grafia da época para adaptá-la aos dias correntes:

"Assim como tem o velho e o novo é muito natural que tenha o velho e o novo casamento com a mesma mulher... e hoje véspera do meu casamento fazendo 25 anos que sou casado, neste caso venho festejar as bodas... propondo um novo casamento com a mesma mulher, visto como o primeiro não prestou... porém com as seguintes condições: 1) não ter (minha mulher) contato com sua irmã Porcina Dias Ribeiro. 2) não ter contato com qualquer um dos filhos que se achar em desavença comigo. 3) nada fazer sem me ouvir, nem que seja para mudar uma palha de um lugar para outro. 4) eu não estando em casa não deve sair para parte alguma nem que seja na vizinhança... e nem andar na rua depois das seis horas da tarde. 5) se achar em casa sempre na hora do café pela manhã, na hora do almoço, na hora do jantar. 6) todas as vezes que tiver conhecimento de que o Bispo Dom Severino Vieira de Melo tem de pregar, deve largar o que estiver fazendo para ir ouvir o sermão do mesmo. 7) no lugar em que nos encontramos sempre que houver missa aos domingos, temos que irmos juntos. 8) saímos juntos de braços dados sempre que eu entender. 9) fico com os poderes de aumentar ou diminuir todos os mandamentos do novo casamento, sempre que julgar preciso. 10) cumprindo todos estes mandamentos, terá direito a tudo que estiver no meu alcance".

Dondon deu muito trabalho aos políticos piauienses de todas as categorias: governadores, deputados, homens de governo. Contou pelo jornal a luta de governo. Contou pelo jornal a luta desenvolvida para adquirir tipografia. E escreveu que a vitória lhe custou o seguinte: 1) Custou-me no começo de 1919 o major do Exército Antônio da Costa Araújo Filho apoderou-se de três vacas minhas, sem o meu consentimento. 2) Custou-me no dia 13 para amanhecer 14 de maio de 1925 terem querido tirar a minha vida a traição e que ainda recebi três bordoadas, pro este motivo deu em resultado eu passar 21 meses e quatro dias em casa sem sair à rua. 3) Custou-me no dia 19 de setembro de 1924 mandarem-me meter na cadeia, quando foi no dia 8 de outubro do mesmo ano tornaram a me meter na cadeia e esta segunda vez ainda acharam pouco, da cadeia ainda me mandaram para ser internado no asilo dos doidos, onde passei dias contra a minha vontade e dois por minha conta...".

Jornalismo saboroso, com defeitos e qualidades, muito lido pelos teresinenses da década de 1920. As edições esgotavam-se rapidamente. Uma delas, a que tratou dos enterros na cidade, tornou-se antológica, e ainda hoje é citada das mais interessantes reportagens da imprensa da capital piauiense. Mas a história dos enterros será contada noutra oportunidade.

Dizia-se que Dondon tinha alguns parafusos frouxos, mas a verdade está em que raros possuíam tanta inteligência quanto ele.


A. Tito Filho, 18/03/1992, Jornal O Dia 

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